Fernando "Pisca"
Orgulhoso por ser neto da criadora da arte em areia colorida, Pisca mantém viva a tradição de Majorlândia
Arte colorindo gerações
Em Majorlândia, Fernando Antônio Ciriaco Maia, 57, é mais conhecido como “Pisca”, apelido que ganhou na infância por causa do hábito que tinha de “bater muito a pestana”. Aos 14 anos, começou a fazer arte em areia colorida e, em poucos dias, já conseguia desenhar casinhas rústicas e coqueiros simples. Hoje, realiza um trabalho diferenciado que se destaca no litoral: animais, emblemas de clubes de futebol e até rostos de pessoas.
Pisca vem de uma família de artesãos. Ele e outros quatro netos da criadora dessa arte tiveram uma ótima escola. “Minha avó começou nos anos 60 e o meu tio Toinho que aperfeiçoou. A gente neto já aprendeu com ele”, conta, relembrando como a arte surgiu.

Foi por acaso que Dona Joana, avó de Pisca, descobriu que dava para usar areia colorida em benefício da arte. Com saudades do filho Cizoca, que era marinheiro e estava viajando, ela começou a juntar diferentes tons de areia em garrafas. A ideia de fazer figuras veio quando, acidentalmente, uma das garrafas tombou, deixando formas desenhadas.
As gerações seguintes aperfeiçoaram a técnica, tornando a arte conhecida tanto pelo litoral cearense, como por outras localidades, como Grossos, no Rio Grande do Norte. Dona Joana não imaginava a dimensão que aquilo podia ter. Hoje, a arte que teve início pelas mãos dela é vendida para turistas de diversos países.
Pisca não tem renda fixa, pois depende do turismo. “Aqui é melhor em época de férias. Na baixa estação, as vendas baixam também”, afirma. Mesmo assim, ele diz que consegue sobreviver só do artesanato. As peças que trazem mais retorno financeiro são os retratos que os turistas pedem para reproduzir. “É mais difícil chegar, porque é caro, né? É na faixa de R$ 800,00 a R$ 1.000,00, mas também leva quase uma semana. E muitos também não têm tempo pra esperar. Esses turistas vêm, passam dois, três dias aqui e vão embora”, relata.
Com exceção das cores azul e verde, que são produzidas com o uso de anilina ou tinta hidrossolúvel, a matéria-prima usada para esse trabalho delicado e cheio de detalhes vem das falésias. Até ir parar dentro dos recipientes, a areia passa por um processo que tem início com o trato dos torrões de argila. “Pega da cor que quer, depois mistura num pilão e passa dentro de uma tela pra pegar só o pozinho da areia. Aí depois vai trabalhar, peneira e começa a fazer os trabalhos”, explica o artesão.
É ele mesmo quem confecciona o material de trabalho. As duas extremidades de um pequeno pedaço de ferro são aproveitadas. De um lado, há uma curvatura feita com martelo, que serve para levar a areia até o recipiente. Do outro, uma base reta usada para mover a areia de lugar. Existe ainda uma segunda peça, bem mais fina, ideal para os detalhes dos desenhos.
A última etapa do processo é fechar o recipiente usando uma mistura de cola com areia, que forma uma cimentação. Porém, Pisca revela qual é o segredo para que os desenhos continuem firmes. “A segurança do trabalho é a pressão que a gente dá, não é a cola. Com a pressão, a areia fica compacta. Depois, olha, pode chacoalhar que não tem perigo”, testa.

Também é o próprio artesão quem consegue os recipientes para trabalhar. “Hoje é difícil as pessoas darem alguma coisa a alguém, brother”, comenta. Pisca usa várias peças de vidro, como: taças, garrafas, frascos de perfume e até ampolas. O trabalho é mais difícil quando o recipiente é menor, “por causa da boquinha que é pequena”. No entanto, ele afirma que não demora muito para ficar pronto. “Leva menos de meia hora. Por isso que o preço também é barato”, diz, exibindo peças de R$ 5,00 e de R$ 10,00.
Pisca morou em Fortaleza por 17 anos e teve um ponto de vendas na Beira Mar. Segundo ele, a renda era melhor porque a capital atraía mais turistas. “Fui um dos primeiros que chegou com esse trabalho. Aí em 87, eu perdi o ponto, porque eu vim pra cá, passei um mês, aí perdi o pontinho lá”, recorda, mas não se queixa da situação em que se encontra hoje.
Hoje, ele e outros quatro artesãos trabalham em uma palhoça, que funciona como ateliê. Inicialmente, ele tinha planos de transformar o espaço, situado a poucos metros do mar, em um ponto que também vendesse água de coco, cerveja, tira-gosto. Mas, por falta de dinheiro, não pôde terminar a obra. Apesar disso, Pisca agradece por viver e trabalhar num local que atrai turistas. “Ainda bem que é um ponto turístico… aí a gente bota a mesinha aqui e vende.”, explica.


Eu acho que daqui pro final do ano, a gente monta uma escolinha aqui. Vou montar. Os próprios turistas cobram isso, né? Dizem que é legal.
Seu trabalho não tem nenhum apoio e todos trabalham por conta própria. Mas mesmo sem incentivos, Pisca ainda fala do desejo de montar uma escolinha e ensinar a quem quiser aprender a arte na areia. “Eu acho que daqui pro final do ano, a gente monta uma escolinha aqui. Vou montar. Os próprios turistas cobram isso, né? Dizem que é legal”, declara, com a esperança de manter viva a arte que já atravessou gerações.